Muitas vezes brinco, quando estamos preenchendo a Roda da Vida, perguntando para o cliente como está a relação com a pessoa de quem não é possível se separar nunca… Muitos demoram a perceber que estamos falando da relação do “Eu comigo”. E embora com um ar de descontração, a verdade é essa: se estou bem, se me dou suporte, motivação para continuar rumo aos meus sonhos, ao preenchimento das minhas reais necessidades e valores, se me dou acolhimento e alimento para ultrapassar os obstáculos do caminho, terei uma grande força de sustentação sempre presente e estarei perenemente em boa companhia. Mas se não me conheço, se me deixo à míngua de alimento emocional, de desenvolvimento pessoal ou se uso de desculpas e fugas para não crescer, não amadurecer, se me percebo todo o tempo como vítima e me afogo em copos d’água – posso estar no melhor lugar do mundo, no cenário mais belo, com as pessoas mais bacanas… E ainda assim vai ter algo estranho, uma espécie de gosto de guarda-chuva na boca, porque não sei me dar um ambiente saudável mental e emocional para viver.
Quanto melhor companhia eu for para mim, mais saudável, motivador e harmônico será o meu cenário interno. O que, de quebra, me dá mais condições de compreender o outro, dar a ele o que precisa e ajudá-lo a entender o que eu necessito.
A questão é que nem sempre as pessoas ficam nessa relação de harmonia e equilíbrio com o seu próprio Eu. Parte das pessoas se cobra demasiadamente, exigindo-se a manutenção de um dado desempenho sem levar em conta o momento em que a coisa está se passando. Não se dão tempo e/ou qualidade de lazer, de descanso e nutrição afetiva suficiente, abusam da saúde no afã de chegar num dado objetivo o quanto antes, atropelando tudo pelo caminho, até as bases de sustentação da própria vida… E uma hora, mais cedo ou mais tarde, o gás acaba, a exaustão física, mental e/ou emocional chega e cobra seu preço. E quando isso acontece, esse tipo de pessoa nem ao menos consegue pedir ajuda, pedir um colo para descansar e refazer o próprio cenário interno. E não sabe pedir por falta de prática, de costume, porque nunca se permitiu esse refrigério… E para completar, como é uma pessoa que passa a ideia de ser um Rambo das emoções, que se basta, mesmo não agindo assim com o outro, as pessoas ao redor não sabem como fazer para se aproximar, para criar o clima certo para tocar no assunto e oferecer ajuda ou um ombro amigo. O caminho é saber ser mais suave consigo, compreensivo.
Já existe o outro grupo, que cai no excesso de autoindulgência, desculpam-se de tudo, há sempre uma justificativa pronta na ponta da língua, e nessa justificativa, vai ter alguém que criou uma condição distorcida ou problemática para ele, e ele é a grande vítima de uma eterna teoria da conspiração… E repete esse discurso aos quatro ventos sem nem ao menos se dar conta que está falando de algo que ocorreu lá atrás e, décadas depois, é meio incoerente ainda não ter trabalhado para suplantar o acontecido e ter um ferramental mais bem adaptado para ser e estar no mundo. São pessoas que colecionam histórias de brigas, de pedidos de perdão que nunca chegam; são pessoas que acham que suas vidas são tão árduas que é normal não poderem se doar muito, que é normal esquecerem o que prometeram, que é normal que o outro se adapte ao que ela pode dar, porque ela tem tantas restrições, problemas e etc., que o que ela dá é muito… Mas na fala seguinte, ela vai se mostrar ressentida com o que deixaram de fazer por ela, no momento que ela queria e da forma que ela queria, sem levar em conta a situação ou as dificuldades do outro. Esse grupo é o faminto emocional, que exige muito e dá migalhas e nem percebe! Que só procura quando precisa, que liga para o amigo, para o familiar e mal diz “alô, tudo bem”, já despeja todo o caminhão de drama emocional ou o problema da vez, porque tudo é um problema. E realmente tende a ser, porque não costumam trocar ideias antes, despejam problemas depois. E quando o interlocutor corta o assunto ou é mais taxativo, o representante desse grupo se sente pouco acolhido, mal compreendido. E se há uma brecha para o interlocutor dizer que algo não vai bem na sua vida, esse tipo faminto dá um consolo de segundos, pra logo em seguida mostrar que o problema dele é muito maior ou complicado…
Vez por outra podemos nos perceber em um dos polos dessa gangorra. Mas se estamos muito em um desses extremos, é hora de acender um alerta vermelho! Porque não estamos tendo uma relação saudável conosco, e, provavelmente, também não está legal a relação como o outro! Há os que vão se perceber justamente nesse ponto – em tudo ou parcialmente. E ler isso pode gerar algum desconforto ou mesmo uma dor forte. Há os que vão achar que tá faltando mais algum dado nessa história, porque se encaixam no que ocorre do outro para com eles, mas não deles para com os outros. Para aqueles que estão na dor, peço desculpas, minha intenção não é essa, o desconforto é necessário porque é ele que vai gerar a mudança, pois enquanto estamos na zona de conforto, dificilmente fazemos alguma ação extra. E o que posso dizer é que não permaneça na dor, ela não precisa acontecer, use essa dor como um termômetro para tomar consciência da necessidade de mudança pra com você em primeiro lugar. Porque, de fato, você merece mais da vida e dos outros, e pra isso é imprescindível estar numa energia proativa e aberta para surfar essa nova onda.
E para os que acham que eles só são realmente as vítimas, a grande maioria sabe, lá no fundo, que estão recebendo, sim, mais do que estão dando, inclusive para si mesmos… E a prova real é simples: o que sentiria se na hora do sufoco, do erro ou da fragilidade, tivesse uma mãe , um pai, um amigo ou um namorado(a) agindo como você costuma agir com eles? Qual foi a última vez que você realmente deu suporte a alguém, que já te deu suporte, da maneira que aquele alguém precisava? Essa resposta vai te dizer muita coisa, se você tiver coragem de se responder verdadeiramente. E aí será fácil perceber se você é o seu maior algoz ou se você está se mimando tanto que parece aquelas crianças que ninguém consegue brincar porque não tem limites. E, no caso real de ser uma vítima, saia desse padrão, perceba a brecha para mudar internamente, para deixar de ser vítima e virar construtor de uma vida plena, a vida sonhada. Sempre há o que fazer, creia nisso e busque outro modo de perceber a dinâmica da situação, você achará a saída – sozinho ou com uma ajuda profissional. Um mundo de possibilidades, de paz, de saúde e motivação existe dentro de você, pronto para ser usufruído!